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Os Aspectos Gerais do Planejamento Tributário

Os Aspectos Gerais do Planejamento Tributário

O planejamento tributário é uma prática legítima, voltada à organização das atividades empresariais com o objetivo de eliminar, reduzir ou postergar a incidência de tributos, desde que observados certos limites.

 

A adoção de estruturas jurídicas adequadas e o uso de mecanismos autorizados em lei configuram exercício regular do direito do contribuinte, sendo essencial que tais práticas estejam fundamentadas em propósitos negociais legítimos e revestidas de substância econômica.

 

Base legal e evolução normativa

 

A disciplina do planejamento tributário no Brasil ganhou contornos mais definidos a partir da inclusão do parágrafo único ao artigo 116 do Código Tributário Nacional (“CTN“), por meio da Lei Complementar n.º 104, de 2001. O referido dispositivo prevê:

 

Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos:
 
I – tratando-se de situação de fato, desde o momento em que o se verifiquem as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos que normalmente lhe são próprios;
 
II – tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja definitivamente constituída, nos têrmos de direito aplicável.
 
Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária.”

 

Com base no referido dispositivo, verifica-se que a administração tributária tem a prerrogativa de desconsiderar atos artificiais, desde que comprovado o desvio de finalidade ou a ausência de conteúdo econômico, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária.  A lei ordinária nunca foi editada, razão pela qual muitos juristas questionam, inclusive, a validade do mencionado parágrafo único.  Na prática, contudo, as autoridades fiscais normalmente analisam as operações levando em consideração a sua substância e finalidade.

 

Finalidades e benefícios do planejamento tributário

 

Quando realizado de maneira lícita e fundamentada, o planejamento tributário pode gerar importantes benefícios para a organização empresarial, entre os quais se destacam:

 

  • Redução da carga tributária com base em alternativas legais;
  • Aumento da competitividade, por meio da gestão fiscal eficiente;
  • Segurança jurídica, ao evitar autuações e litígios desnecessários;
  • Previsibilidade financeira e controle dos custos tributários;
  • Aproveitamento de incentivos e regimes fiscais permitidos por lei; e
  • Otimização do fluxo de caixa, com planejamento das obrigações fiscais no tempo.
  •  

    Tais benefícios, como mencionado, dependem da adoção de medidas estruturadas com observância às previsões legais, evitando práticas abusivas ou simuladas.

     

    Elisão, evasão e simulação: distinções jurídicas

     

    Neste contexto, faz-se necessário distinguir três figuras conhecidas no campo tributário, a saber: elisão, evasão e simulação:

     

    ELISÃO FISCAL

    LÍCITA

    Planejamento tributário realizado antes do fato gerador, utilizando meios legais para reduzir ou evitar a incidência tributária.
    É uma conduta permitida e incentivada pelo ordenamento jurídico.

    EVASÃO FISCAL

    ILÍCITA

    Sonegação fiscal que ocorre após o fato gerador, através de fraudes, omissões ou falsificações para não pagar tributos devidos.
    Constitui crime contra a ordem tributária.

    SIMULAÇÃO

    ABUSIVA

    Elisão ineficaz que utiliza negócios jurídicos aparentemente válidos, mas sem propósito negocial real, visando apenas economia tributária.
    Pode ser desconsiderada pelo Fisco.

    Aspecto Elisão Fiscal Evasão Fiscal Simulação
    Momento Antes do fato gerador Após o fato gerador Antes do fato gerador
    Legalidade Legal Ilegal Questionável
    Consequências Economia tributária válida Multa e processo criminal Desconsideração pelo Fisco
    Exemplo Escolha do regime tributário Omitir receitas na declaração Operações sem substância econômica

     

  • Elisão fiscal: é uma conduta lícita, realizada antes do fato gerador, mediante o uso de mecanismos legais para evitar ou reduzir a incidência tributária. É aceita e prevista no ordenamento jurídico.
  • Evasão fiscal: é uma prática ilícita, posterior ao fato gerador, caracterizada pela omissão de receitas, fraudes ou falsificações com o objetivo de sonegar tributos. Enquadra-se como crime contra a ordem tributária.
  • Simulação: a operação formalmente é lícita, mas não possui qualquer propósito negocial, de modo que a única finalidade é obter economia tributária. Pode ser desconsiderada pela autoridade fiscal com base no artigo 116, parágrafo único, do CTN.
  •  

    Substância econômica e propósito negocial

     

    A validade das estruturas adotadas no planejamento tributário depende, normalmente, da presença de dois elementos:

     

  • Substância econômica: exige que o negócio jurídico tenha efeitos reais, refletindo uma efetiva reorganização ou atividade empresarial, e não apenas uma aparência formal.
  • Propósito negocial: refere-se à necessidade de que a operação tenha um objetivo empresarial legítimo e concreto, distinto da simples economia fiscal.
  •  

    A ausência desses elementos pode acarretar a desconsideração da operação, a aplicação de penalidades fiscais qualificadas e a responsabilização solidária de sócios e terceiros envolvidos, conforme os artigos 124 e 135 do CTN.

     

    A identificação da existência ou não de propósito negocial nem sempre é uma tarefa fácil, já que depende da identificação de motivos extrafiscais.  A título exemplificativo, é possível citar a segregação das atividades econômicas, tema bem controvertidos, havendo decisões favoráveis e desfavoráveis aos contribuintes proferidas pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (“CARF“):

     

    ❌ Ausência de propósito negocial (decisão desfavorável ao contribuinte)

     

    Em um recente julgamento, o CARF desconsiderou a segregação das atividades realizada por determinado contribuinte por não ter identificado qualquer razão extrafiscal para tanto, de modo que o único objetivo era realmente reduzir tributos.  Não havia, portanto, qualquer autonomia funcional ou substância econômica entre os entes envolvidos, razão pela qual a operação realizada foi desconsiderada.  Vejamos breve trecho extraído da decisão:

     

    A organização empresarial de um conjunto de atividades sujeito a controle comum, sem autonomia e com o objetivo principal de redução de tributos, permite a reconsideração das relações jurídicas, vinculando os efeitos tributários à empresa efetivamente beneficiária.” (Acórdão n.º 2102-003.735, julgado em 9.5.2025 – CARF)

     

    ✅ Propósito negocial reconhecido (decisão favorável ao contribuinte)

     

    Em outro caso também envolvendo segregação de atividades econômicas em entidades distintas, CARF reafirmou que o contribuinte possui liberdade de organizar seus negócios conforme o modelo mais eficiente, desde que fundado em finalidade lícita:

     

    A abertura de nova sociedade, com autonomia financeira e operacional, para fins produtivos complementares, mesmo que gere economia tributária, é válida na ausência de simulação ou fraude” (Acórdão n.º 1401.007.372, julgado em 28.1.2025 – CARF)

     

    Há, portanto, uma linha muito tênue entre um planejamento tributário lícito e um planejamento tributário ilícito, razão pela qual os contribuintes precisam se atentar aos detalhes antes de realizar qualquer mudança na operação ou estrutura.

     

    Critérios de fiscalização e riscos

     

    Apesar de envolver uma análise casuística, a fiscalização tributária tem se baseado em parâmetros objetivos para identificar estruturas artificiais. Entre os pontos de atenção, destacam-se:

     

  • Falta de substância econômica;
  • Ausência de propósito negocial;
  • Utilização de operações circulares ou artificiais;
  • Estruturas excessivamente complexas e sem função operacional;
  • Atuação em paraísos fiscais sem justificativa econômica; e
  • Ausência de autonomia patrimonial e administrativa entre as partes envolvidas.
  •  

    A constatação de tais elementos pode resultar em autuações fiscais com multas relevantes , bem como consequências cíveis e penais, nos casos de dolo, fraude ou simulação.

     

    Conclusão

     

    O planejamento tributário, quando exercido dentro dos limites legais e com finalidades negociais legítimas, é instrumento essencial à gestão empresarial. Sua adoção deve ser precedida de análise técnica rigorosa, documentação adequada e alinhamento com a jurisprudência administrativa.

     

    Estruturas artificiais, destituídas de substância ou justificativa econômica, além de vulneráveis à desconsideração fiscal, comprometem a integridade da operação e expõem os envolvidos a riscos significativos. Já o planejamento responsável contribui para a eficiência fiscal, a redução de custos e a conformidade tributária das organizações.

    Artigo elaborado por Larissa Taveira, advogada nas áreas de Tributário e Planejamento Patrimonial e Sucessório.

    Se você tiver alguma dúvida ou quiser continuar a conversa acerca de qualquer dos aspectos aqui debatidos, entre em contato conosco por meio do e-mail comunicacao@pinheiroguimaraes.com.br.


       

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